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domingo, 20 de setembro de 2009

Cãimbras e Ultra-endurance


Segundo Astränd, 2000, existem duas classificações para as cãimbras fora do estado de repouso, que são respectivamente as por Fadiga Central, envolvidas com o processamento no Sistema Nervoso Central - SNC e as por Fadiga Periférica, onde especula-se um rol de causas e mecanismos que ainda não estão completamente elucidados.
Vira e mexe vejo por aí o tema em capas de revistas, sites sobre atividade física ou na mídia em geral. E, acompanhado disso, muita informação (às vezes bem equivocadas), e, infelizmente, o incentivo à crença de que as cãimbras podem ser evitadas e que os mecanismos já estão completamente elucidados. É justamente por não estarem que escolhi este tema para meu post.

Especula-se que o mecanismo das cãimbras por fadiga central estejam envolvidos nos entrames fisiológicos que regem a fisiologia da contração muscular, principalmente na bomba de sódio e potássio, que tem correlação direta na cascata de despolarização-repolarização da membrana, que é o estímulo nervoso por si só. Certamente, qualquer alteração na concentração sérica ou na proporção destes dois íons - Na+ e K+ influirá no mecanismo da contração muscular.

Por muito tempo acreditou-se que as causas das cãimbras no exercício estavam diretamente correlacionadas à queda dos níveis sanguíneos de potássio do atleta - potassemia. Essa premissa ganhou ainda mais força no Brasil com o hábito do tenista Gustavo Kuerten de comer banana nos intervalos de seus jogos - fruta que tornou-se referência como fonte de potássio.
Fisiologicamente, esta teoria vem perdendo força através de diversos estudos longitudinais que comprovam que a potassemia pré e pós-prova normalmente se mantém, pois as quantidades de potássio perdidas são facilmente repostas com o a reposição hídrica e energética durante a prova. (MARA, Lourenço Sampaio de et al. Alterações hidroeletrolíticas agudas ocorridas no Triatlon Ironman Brasil. Rev Bras Med Esporte [online]. 2007).

Do ponto de vista nutricional, também seria mais fácil virarmos esquilos do que macacos, onde, por exemplo, encontramos em torno de 700mg/100g de potássio nas amendoas em geral contra 350mg/100g na banana. Ou, ingerir potássio manipulado na dose pretendida. (TACO)

Então, a linha dos estudos mudou um pouco de direção e vem se tentando estudar a relação distúrbios em outros íons ou propriamente no solvente (água). Porém, para que possamos discutir de forma mais clara, vale a pena ressaltar que o mecanismo das cãimbras, independente da causa direta ou predominante, é multifatorial. Ainda que se tente estudar a causa primária ou predominante, outros fatores estão envolvidos e são contribuintes nesse episódio.

Segundo Lemos, 2007, os valores de sódio sérico também se comportam quase que igualitariamente no pré e pós-prova durante o triathlon Ironman - 3,8km / 180km / 42km. Porém, um dado obtido pelo mesmo autor mostra que a concentração relativa do sódio em alguns casos apresenta-se depurada, em função do estado superhidratado, e que, normalmente é realizado com nutrição pobre em sódio. De 89 competidores monitorados, 83 apresentaram-se com algum grau de desidratação, sendo 50 enquadrados em desidratação leve, enquanto os outros 6 apresentaram-se com o peso acima do pré-prova. Dentre o grupo desidratado, apenas atletas do grupo com desidratação leve apresentou hiponatremia (Na < 135), mais precisamente 7 atletas, ou 14%; 33% dos atletas do grupo de superhidratados apresentaram hiponatremia.
Estes dados ainda não são suficientes para estabelecer uma relação entre superhidratação e hiponatremia, visto que 77% dos atletas não a apresentaram e outros fatores podem influir nas concentrações de sódio sanguíneo durante o exercício, principalmente o realizado no pré-prova.

Estes dados também não nos dão abertura a correlacionar cãimbras, superhidratação e hiponatremia, visto que não se correlacionou a incidência de cãimbras durante a prova e o estado de hidratação. Porém, nos dá margem para considerarmos a hiponatremia e superhidratação como possíveis agravantes visto que a incidência da queda de sódio é maior em atletas superhidratados.

Algumas práticas comuns por atletas também tem o seu certo valor agravante neste evento.
É sabido que o armazenamento intramuscular de carboidrato na forma de glicogênio envolve o concomitante armazenamento de água. Estima-se que para cada grama de glicogênio estocado envolva-se 4g de água. Isso é facilmente percebido pelo notório ganho de peso em atletas envolvidos em dietas pré-prova de supercompensação de carboidratos (80% CHO), enquanto não há aumento da massa magra e gorda. O mérito desta prática não cabe discutir aqui agora, porém merece um futuro post, pois já existem estudos que questionam o custo dessa prática para o atleta, visto que o armazenamento de água intramuscular se eleva, aumentando a possibilidade de cãimbras e que a redução da carga de treino no polimento talvez por si só já produza o efeito necessário quando o indivíduo mantém a sua dieta de treino normal.
Fatores como ritmo de prova (atuando no mecanismo da cãimbra através do SNC), temperatura, estado emocional têm sido citados na literatura e certamente merecem maior exploração também.

Por fim, o que vale considerar é que o evento da cãimbra é multifatorial e comumente misterioso.
Sabe-se que a patologia deste evento, principalmente o periférico, se dá pelo desequilíbrio entre o sódio e potássio séricos, porém, cogita-se a alteração em outros mecanismos envolvidos na contração muscular, dentre hormonios e outros íons; e que, caso exista alguma correlação entre hiponatremia e cãimbras, essa se dará na Hiponatremia Hipotônica com Expansão de Volume Extracelular, ou seja, deixando claro que o consumo de sódio na maioria das vezes é adequado, porém, alguns problemas em relação ao consumo de água.

Como um célebre professor meu já citou, praticamente nenhuma prática aguda ou pontual - ou seja, no dia da prova - é capaz de ajudar ou prejudicar (ou garante sucesso ou inssucesso) severamente a performance, como uma noite bem ou mal dormida na véspera da prova, a ingestão de um gel especial, ou hiperidratação/desidratação DURANTE a prova, reposição/falta de sódio DURANTE a prova, dentre outros, e que, quando sabemos que fatores como recuperação, sono, nutrição, equipamentos, etc. tem alto valor contribuitivo para a performance, o seu efeito sobre ela se dá sempre de forma crônica. Sendo assim, eu tento especular que qualquer fator que esteja envolvido com algum inssucesso ou sucesso numa prova está montado dentro do que se fez no dia anterior e não do que se fez na prova, salvo algumas exceções, como provas de mais de 24h, visto que muitas dessas provas chegam a durar de 3 dias a um mês, deixando claro a sua cronicidade.

Lucas Helal
Graduando em Educação Física - 4 período

2 comentários:

Jorge Cerqueira disse...

Muito boa a matéria parabéns...
Bons treinos,

Jorge Cerqueira
http://jmaratona.blogspot.com

Gentil Jorge Alves Junior disse...

que porra de cabelo era esse? agora q vi